CAMINHANDO E CANTANDO...

A origem de gostos, costumes, medos, sonhos e tantas outras coisas, encontram-se na história pessoal de cada um. Vou contar um pouco da minha.

Quando pequena, não lembro bem a idade, vi no programa Aqui e Agora do Gil Gomes, meu avô Francisco Gomes da Silva (natural de Garanhuns-PE) sendo preso e acusado de roubo. Ele ficou encarcerado durante meses, injustamente, apenas por ter o mesmo nome que o culpado. Era o que a justiça alegava na época. A reportagem relatava os erros cometidos na confusão entre o ladrão e meu avô que nos contava a história com muita dor e indignação.

Tive outro avô (este por parte de mãe) que infelizmente não conheci, mas que sempre ouvi muitas histórias a seu respeito. Camponês de Minas Gerais, conta minha mãe que um dia ele chegou em casa e comentou: “Olha, apareceu um cara barbudo, metalúrgico e que anda falando muito por ai”. A política era tão intensa em sua vida que quando políticos contrários a sua linha ideológica ganhavam, ele sumia uns três dias.

Eram histórias que ouvia mas não compreendia.  

Em 1994, meu destino era Ilha Comprida, um paraíso do Vale do Ribeira onde tive a oportunidade de receber um excelente ensino. Professor Sérgio Careca dava aulas de História com músicas do Legião Urbana, Professora Maheli despertava um encantamento pela Língua Portuguesa, Professor Eduardo aplicava a Geografia através dos pedacinhos da nossa pequena cidade. O que não compreendia na sociedade, agora tomava formas e cores que se apresentavam de uma maneira bela e rude.

Infelizmente, em 2001 a vida virou esta página com cheiro de maresia e segui para Guarulhos. Uma época difícil. Tive que recriar um castelo que havia se dissolvido. Antes as manhãs eram acompanhadas de músicas do Tonico e Tinoco da Radio Xixinelo, agora acordava ouvindo Racionais. Quem são esses caras??? Uns diziam: “bandidos e suas músicas são apologia ao crime”. Já outros falavam que eram uns caras que faziam musicas de protesto. A curiosidade aumentava e passei a ouvir escondido na casa de uma vizinha. Era uma rebeldia gostosa e sem sentido porque ainda não entendia certas coisas com mais clareza.

Fim do ensino médio, primeiro trabalho e aquele barbudo que meu avô tinha comentado há muitos anos atrás, tornou-se Presidente do Brasil. Minha mente estava possuída pelo sonho de ingressar em uma Universidade. Algumas barreiras surgiram, mas o sonho persistia. Foi quando conheci o cursinho comunitário Educafro que me deu a oportunidade de estudar e complementar minha formação. Neste tempo, convivi com pessoas que enfrentavam dificuldades, compartilhavam sonhos, ideias e todas eram coloridas pelas cores da justiça social. Comecei então a entender os episódios que relatei no começo deste post, a injustiça cometida com meu avô por parte de pai e esperança do meu avô por parte de mãe. Também revisitei as músicas que ouvia dos Racionais quando me mudei para Guarulhos e agora elas faziam sentido. Cheguei à conclusão de que o mundo era uma grande catástrofe com desigualdades sociais, injustiças, desprezo, ganância, hipocrisia e corrupção. No cursinho, participei de várias manifestações, rodas de conversa, viajamos para Brasília para reivindicar as promessas que o Presidente barbudo havia dito. O foco ainda era a Universidade e essas experiências me proporcionaram viver aquilo que lia nos livros. Sou muito grata por experimentar momentos tão importantes como estes.

Em 2007, concretizei o sonho de entrar em uma Universidade. Estudei a mente, a sociedade, as pessoas... Achei que todas as minhas perguntas seriam respondidas, mas o que aconteceu foi o contrário. Surgiram mais e mais. Afastei-me da Educafro, decepcionei-me com aqueles que representavam os nossos sonhos. O sistema os tragou. Tristeza... 
Em tempos difíceis, leio a bíblia para encontrar conforto e renovar as esperanças:

“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos”

Hoje vivemos um período que polariza opiniões políticas. Temos uma classe politica reacionária, elitizada, machista, um presidente denunciado por crime de corrupção, um judiciário pressionado pelos poderes executivo e legislativo, o Brasil vive uma das mais graves crises institucionais de sua historia. Isso me fez relembrar todas as coisas que escrevi aqui, renascendo o grito que se escondia em mim. Hoje este grito está mais sereno, sem perder a coloração política avermelhada.

Na luta por justiça, minha caminhada continua a minha maneira e tenho pra mim seu final será em meio a uma multidão guiada pelo Líder dos líderes, Cristo Jesus, onde cantaremos:

Caminhando e cantando e seguindo a canção
Somos todos iguais braços dados ou não
♫ ♪


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